terça-feira, 22 de outubro de 2013

Leitura de um poema de Camilo Pessanha


Leitura de um poema de Camilo Pessanha  [1]



Ó cores virtuais que jazeis subterrâneas,
- Fulgurações azuis, vermelhos de hemoptise,
Represados clarões, cromáticas vesânias -,
No limbo onde esperais a luz que vos batize,
 
As pálpebras cerrai, ansiosas não veleis.
 
Abortos que pendeis as frontes cor de cidra,
Tão graves de cismar, nos bocais dos museus,
E escutando o correr da água na clepsidra,
Vagamente sorris, resignados e ateus,
 
Cessai de cogitar, o abismo não sondeis.
 
Gemebundo arrulhar dos sonhos não sonhados,
Que toda a noite errais, doces almas penando,
E as asas lacerais na aresta dos telhados,
E no vento expirais em um queixume brando,
 
Adormecei. Não suspireis. Não respireis.
 


 
               Clepsidra é o nome que tem sido dado às coleções possíveis de versos de Camilo Pessanha. Uma ordenação significativa autorizada pelo poeta parece ser algo irremediavelmente perdido, se é que alguma vez existiu. E se existiu, dificilmente terá sido integrada por todos os poemas que até hoje os vários editores foram reunindo sob o título emblemático do lugar de escoamento da água, imagem e medida do transcurso ininterrupto do tempo.
               Entretanto, do que talvez tivesse sido um desenho de conjunto, um projeto do livro dos versos de Pessanha, restam duas balizas: uma quadra em que um “eu” afirma o desejo de “no chão sumir-se, como faz um verme” e esta invocação dos estranhos interlocutores que só a voz do poeta constitui em existência. Quanto ao lugar inaugural da quadra denominada, por alguns, “Inscrição”, não há prova documental, apenas a tradição das várias edições e a coerência de lugar e de sentido. Já o presente poema foi identificado pelo próprio poeta, numa versão preliminar, como a “última página de um livro em tempos delineado”.
               Ganham, pois, os poemas com a leitura conjunta, que ressalta o desejo de trânsito entre superfície e profundeza, entre o interior e o exterior da terra. Na quadra, a languidez da alma produz o desejo de “deslizar sem ruído”, de desaparecer por meio de um mergulho regressivo, que supõe a perda das defesas e das características humanas. Neste, o movimento começa com o anseio das cores subterrâneas pelo batismo da luz que lhes dê existência – portanto, com o desejo de emergir da terra que as recobre – e prossegue com a apresentação/invocação de outros seres que ainda não chegaram a existir e que aparecem situados em graus crescentes de afastamento do solo: primeiro, os abortos nas prateleiras ou nas mesas dos museus; depois, os sonhos, à beira dos telhados.
               Ressalta também, da leitura conjunta, o lugar em que se situa a voz lírica, que é o lugar da consciência do desejo. Lugar analítico por excelência. No primeiro caso, o da quadra, o desejo é do próprio sujeito que o expressa: desejo de inconsciência, de alívio de uma situação que é sentida como destino, como efeito de uma circunstância de ordem mais ampla: “eu vi a luz em um país perdido”. No caso do poema final, o desejo é atribuído ao interlocutor. A voz lírica é o lugar da experiência que aconselha justamente a cessação do desejo. Este, por sua vez, tem um lugar aporético: é o desejo de existir, postulado como origem da frustração e da dor de seres ainda inexistentes, ou já não existentes.
               Na primeira estrofe, as cores virtuais, ao jazerem enterradas, forçam a percepção de que a base metafórica são os fenômenos da decomposição orgânica: a loucura produtora de alucinações coloridas, a expectoração dos tuberculosos e o fogo-fátuo. O procedimento lembra a morbidez irônica de outros versos. Aqueles nos quais as várias substâncias geradas pela putrefação dos cadáveres são objeto de contemplação, como produtoras de formas e de cores: “putrescina! – flor de lilás! / cadaverina! – branca flor do espinheiro!”. A possibilidade da leitura é reforçada pelo verso 4, que traz as imagens complementares do limbo e do batismo, em relação inversa. A decepção da esperança de fuga do lugar de inércia, por meio do ritual que se destina justamente a evitá-lo, contribui para o adensamento agônico da materialidade corporal das imagens, além de preparar a menção aos natimortos que comparecerão logo adiante no poema. O verso 5, destacado espacialmente dos anteriores, dos quais é entretanto a seqüência sintática, nos põe de súbito em face dos olhos dos enterrados, aos quais se aconselha que se fechem finalmente, sem esperança de término da vigília dolorosamente empreendida.
               Na estrofe seguinte, a apóstrofe se dirige aos que não nasceram, mas cujos corpos se preservam incompletos, intactos, modificados apenas na coloração. Habitantes de outro limbo, o asséptico dos museus, são explicitamente afastados, pela negação, de Deus. Seu mundo não é o da expansão das cores, mas o da concentração sonora. Não é o da terra, a que deve retornar o pó; mas o da água. E a força da estrofe provém em grande parte do contraste entre as duas imagens da água, uma explícita e outra implícita. Explícita é a água que corre na clepsidra: o tempo que flui. Implícita é a água parada, o líquido em que flutuam os corpos metidos nos frascos, na paralisação do fluxo vital interrompido. Embora sejam também figurações da impossibilidade de uma consciência sem vida, contrastam os abortos com as cores virtuais: sem ansiedade, sem esperança de redenção, ouvem resignados e talvez irônicos a passagem do tempo, a que já estão imunes. Ecoam, com o seu vago sorriso confinado nos invólucros de vidro, um outro poema de Pessanha, que também é estruturado sobre a imagem paradoxal do cadáver consciente e reflexivo: o morto que se ri do fato de que nada do que passa sobre a sua sepultura lhe dói minimamente. A esses a voz lírica aconselha a cessação da atenção e da busca de respostas.
               Neste momento do poema, as duas pontas do ser orgânico foram interpeladas: aquela em que a vida ainda não se realizou plenamente, imagem de um momento congelado, de promessa sem realização; e aquela em que o ser, já passado o momento da morte (no qual um outro seu texto via o surgimento de um aspecto de “imortal serenidade”), se desfaz na escuridão da tumba, esporadicamente cortada de clarões e cores sem esperança de redenção. Entre elas se deve situar logicamente o espaço da vida. Se assim for, ela aqui é identificada ao sonho, e seu grau de irrealidade e indefinição acaba por parecer maior do que o dos momentos terminais.
               No terceiro bloco, interpelam-se os “sonhos não sonhados”. Do ponto de vista da construção metafórica, completa-se o quadro lúgubre do poema, juntando a imagem das almas penadas à das aves noturnas que se ferem de morte contra os limites da casa, e encarnam mais explicitamente o anseio, já marcado de dor, pela existência. Noturna, não há nessa estrofe nenhuma menção de cor. Em compensação, é o mais sonoro dos três blocos em que se divide o poema. Não apenas porque refere o arrulhar, a expiração e os queixumes dos sonhos, ou bater das suas asas nas arestas dos telhados. Mas principalmente porque a estrofe toda se eriça de aliterações e assonâncias e, principalmente, porque uma mesma rima de grande sonoridade retoma e sistematiza o procedimento (inaugurado na primeira estrofe) de explorar a cesura do alexandrino: virtuais, esperais, (cerrai), errais, lacerais, expirais. Essas três últimas palavras, ecoando os seus “ais” na sexta sílaba de três versos seguidos, martelam a gradação das ações atribuídas aos sonhos, mostrando que mesmo aquilo que não chegou a existir (os sonhos que não foram sequer sonhados), aquilo que poderia ser descrito, portanto, como pura potência sem ato, tem um périplo de sofrimento e morte. Nesse sentido, o poema vai num crescendo: a relação desejo/dor vai sendo vazada em imagens de materialidade crescente. À medida que prossegue a leitura, mais intensa se torna a presença do desejo de vida e mais intensa parece a dor que surge associada a ele.
               Para essa percepção de intensidade contribui a leitura do verso final, que, diferentemente do padrão estabelecido nos blocos estróficos anteriores, não é sintaticamente bipartido, mas tripartido. Como os anteriores, abre-se com um imperativo afirmativo, a que se segue um negativo. A diferença é que há agora duas frases de ordem negativa, e que a sua forma de construção coloca em destaque – pela repetição do mesmo padrão métrico (o péon quarto), da estrutura sintática e da pontuação – a palavra de negação.
               A tripartição do verso final também encerra uma gradação de intensidade: o sono, a ausência de reação à dor, a parada da respiração. É a morte absoluta, afinal, o conselho que aqui se cristaliza, após ter sido preparado pelos versos isolados após cada quarteto. E o que a morte absoluta significa, neste quadro particular, em que os interlocutores não estão vivos, é a cessação do paradoxal desejo de existir.
               Os seres interpelados nos três blocos do poema ocupam espaços simbólicos diferentes e bem delimitados. Os primeiros se situam num espaço de exterioridade inominada, apenas referida metaforicamente como “limbo”, cujo elemento é a terra. Confinados, seu desejo de redenção se manifesta também como desejo de exteriorização, de subida em direção ao ar e à luz. Os terceiros, ao que parece, localizam-se no espaço privado da casa, do lar. Associados aos pombos que habitam os beirais, o limiar da exterioridade, seu desejo de serem sonhados é também o desejo de passarem à interioridade do espaço íntimo, e sua permanência na virtualidade é também a sua condenação à morte no espaço da exterioridade da noite e do vento.
               Já os segundos se situam no espaço social, público e controlado do museu. O elemento predominante na estrofe que os apresenta é a água. Mas neles mesmos não há movimento, nem anseio por movimento. Imagens da quietude desesperançada, os abortos comparecem como o momento do equilíbrio possível. Oferecendo-se quietamente como espetáculo visual, dotados da materialidade que falta aos outros interlocutores da voz lírica, os não-nascidos parecem imunes à esperança e à dor do anseio pela existência. Nesse sentido, são o equilíbrio possível no quadro do poema.
               Por uma carta juvenil, sabe-se que, em algum momento, Pessanha pensou em organizar o conjunto dos seus poemas segundo um desenho temático centrado no tema do desejo e do prazer (realização possível e destruição do desejo). A leitura seqüencial conduziria à constatação de que lutar pelo prazer é o mesmo que lutar pela extinção do desejo e pela morte. A vida, portanto, era identificada ao momento tenso, cheio de energia e de dor, no qual a carência move em direção a um objeto, cuja posse dissipa a tensão e é sempre deceptiva em si mesma. Talvez por isso a vontade de fixar, preservar ou celebrar o momento anterior à realização do desejo seja um dos motores da lírica de Pessanha, responsável por alguns dos seus poemas mais célebres. Uma das suas melhores concretizações é o soneto que começa “Depois da luta e depois da conquista”. Mas já neste poema final, escrito para encerrar o conjunto dos seus versos, o desejo em busca de realização é objeto apenas de piedade. Não se fixa heroicamente, como idealidade solar fadada ao obscurecimento e à decomposição; nem se celebra como furor, como febre que produz imagens irreais de integração, como no díptico iniciado pelo soneto “Desce em folhedos tenros a colina”. Pelo contrário, num poema em que o elemento ‘fogo’ é o grande ausente, o momento da luz possível entre as duas cenas noturnas de sofrimento desejante é o momento em que repousam, indiferentes ao correr do tempo, os abortos desprovidos de transcendência.
               Pessanha escreveu certa vez que, apesar do progresso da ciência, permanecerá intocado um espaço incognoscível, “da beira de cujo abismo as almas meditativas continuarão, por todo o sempre, a debruçar-se terrificadas e ansiosas”. Era uma frase que situava o espaço da poesia, indicando a condição da sua continuidade num mundo dominado pelo conhecimento positivo.
            Nesse quadro, se este poema foi escrito para encerrar o livro que reuniria os poemas de Camilo Pessanha, ressalta agora que a imagem da estrofe central pode ser lida como uma figuração irônica da própria condição do pensamento filosófico ou poético. Irônica não apenas porque todo o poema ecoa e enfeixa os fios principais da lírica de Pessanha e porque nessa estrofe particular comparece, pela única vez, a palavra que denominaria o conjunto dos seus versos, mas também porque reúne, no espaço da curiosidade científica e do didatismo, os temas constantes ao longo de alguns dos seus melhores versos: a construção da imagem do desejo congelado antes da realização, a cisma sobre o abismo do incognoscível e a descrença na transcendência, que permitiria fugir à fragmentação e redimir o desejo, apontando-lhe um fim que não fosse a própria e estéril extinção



[1] Este texto foi publicado no volume Século de Ouro – antologia crítica da poesia portuguesa do século XX, organizado por Osvaldo Manuel Silvestre e Pedro Serra e lançado pelas editoras Angelus Novus e Cotovia, em 2002.

Poesia e técnica – Poesia Concreta



Poesia e técnica – Poesia Concreta

 [notícia bibliográfica ao final]


               Os anos finais do Império e as duas primeiras décadas da República (proclamada em 1889) foram o momento de esplendor da poesia parnasiana no Brasil.
               Dá-se, nessa época, um fenômeno sem precedentes a história cultural do país: o escritor profissionaliza-se, principalmente por meio do trabalho nos jornais, e ganha estatuto de figura pública de relevo; a vida literária se torna centro de atenção mundana e, mesmo, de definição da moda; a norma linguística, a construção de um padrão culto de língua, especialmente depois da República, ganha o centro das atenções e dos debates, como instrumento de civilização e unidade nacional; ao mesmo tempo, a literatura institucionaliza-se, processo que, sob a liderança de Machado de Assis, conduz à fundação, em 1897, da Academia Brasileira de Letras, da qual o grande romancista seria o presidente vitalício. De modo que, se quiséssemos retomar os termos em que Antonio Candido narrou a história da literatura brasileira, teríamos de celebrar o momento parnasiano como aquele no qual essa literatura já estaria plenamente constituída como um sistema no qual se integram o autor e o público, por meio de um estilo e de uma temática amplamente difundidos e aceitos como ideal de cultura.[1]
                Logo após a Primeira Guerra Mundial, entretanto, com a eclosão do movimento modernista que teria como marco a Semana de Arte Moderna, realizada em 1922, a prosa e a poesia do momento parnasiano e realista – e especialmente a poesia –, passam a ser objeto de ataques por parte dos novos escritores, identificados com os ideais da vanguarda europeia. O momento emblemático do Modernismo, a Semana, pode ser visto também como aquele no qual se inaugura, depois da integração parnasiana, uma nova fase na cultura nacional, a das vanguardas, cuja característica mais evidente, do ponto de vista da recepção, é o divórcio entre o escritor e o público. As vaias que ali se produziram são, sem dúvida, uma recusa ou resistência estética ao novo; mas são ainda o protesto contra o rompimento do que a pequena burguesia talvez visse como um pacto cultural, na medida que os jovens vanguardistas abandonavam e desqualificavam ruidosamente os ideais e valores literários apresentados como caminho de civilização nos primeiros anos da república. Daí que esse público em grande parte se mantivesse fiel aos autores parnasianos e hostil ou indiferente aos modernistas da primeira geração. E daí também que as ressurgências parnasianas marquem a história da poesia brasileira até os dias de hoje.
              A partir de 1930, com o que, no Brasil, se convencionou denominar Geração de 30, a literatura modernista conquista maior público. É o momento no qual ganha terreno o romance nordestino e a poesia em verso livre. O momento de Jorge Amado e Graciliano Ramos, Carlos Drummond de Andrade e Cecília Meireles, para só mencionar os mais conhecidos.
             Já em 1945, com o final da Segunda Grande Guerra, de certa forma encerra-se o período modernista, ganhando a cultura brasileira uma nova configuração, na qual a literatura não parece mais ocupar lugar privilegiado na definição dos rumos da cultura nacional.
            No campo literário, a nova geração que por essa época começa a afirmar-se – denominando-se justamente, para marcar o período pós-guerra, “Geração de 45” – apresenta clara nostalgia classicizante – de acordo, aliás, com uma tendência mundial no segundo pós-guerra – e promove uma espécie de revival parnasiano, no tom do discurso e no renovado interesse pelas formas fixas da tradição poética de língua portuguesa. Mas já não há sombra do momento de esplendor do sistema cultural dos primeiros tempos republicanos, e a sensação geral, que será aprofundada dramaticamente nos anos de 1950, é a de que a característica do novo tempo é o desaparecimento de um público amplo interessado na literatura.
            Esse tema percorre de tal forma a reflexão sobre a poesia na segunda metade do século XX, especialmente a reflexão desenvolvida pelos poetas, que parece difícil apreender o real movimento da recente literatura brasileira – especialmente o da poesia – sem dar a ele a devida importância.
            É esse o foco do presente artigo, que começa pela consideração das proposições do mais significativo dos poetas surgidos em 1945, João Cabral de Melo Neto e prossegue com a análise da resposta da Poesia Concreta aos desafios do tempo, com foco na questão da especificidade e lugar da poesia no mundo dominado pela tecnologia e pela indústria cultural



I. Cabral e a função da poesia moderna


             Em 1954, como parte das comemorações do aniversário de 400 anos da cidade, reuniu-se em São Paulo um grande Congresso Internacional de Escritores, promovido pela Comissão dos festejos e patrocinado pela UNESCO.
             Na seção consagrada à discussão da poesia, o balanço do momento foi feito por Aderbal Jurema, numa comunicação lida no dia 11 de agosto, intitulada “Apontamentos sobre a niponização da poesia”, na qual afirmava que a novíssima geração reagia mal aos desafios do tempo moderno. Segundo ele, os novos adoravam uma atitude reativa: ao invés de viverem plenamente o “drama nas fronteiras da técnica”, refugiavam-se num “artesanato suicida”, que distanciava a poesia do público e só lhe reservava um lugar na “camaradagem do suplemento dominical”.
O tema da perda do público percorre a maior parte das falas do Congresso dedicadas à poesia, independente da nacionalidade do orador. O que dá cor específica à fala dos brasileiros é a ênfase na relação causal entre o divórcio autor/público e o crescimento dos novos meios de comunicação de massa, a percepção de que existe uma feroz concorrência entre a cultura erudita e cultura de massas, com desvantagem notória da primeira:

Será normal que o artista atual, porque não deseja imiscuir-se com as formas inferiores, ou porque receia que os novos métodos de difusão comprometam a sua dignidade, será normal ao artista eximir-se de participar, fugir à realização, silenciar, não concorrer? Parece-me que não e o seu dever é adaptar-se às novas condições, salvaguardando naturalmente a sua integridade e a qualidade dos seus padrões... Se os novos meios se considerarem obras diabólicas, fugir, isolar-se deles, é abandoná-los ao diabo. Não é esse o dever do espírito, mas sim vencer o príncipe das trevas.[2]

             Assim se expressava, a propósito, Afrânio Coutinho, um dos mais reconhecidos homens de letras do país.
Na mesma época, a concorrência entre as artes e a indústria cultural mereceu a atenção analítica, de outro crítico de grande expressão, Antonio Candido, que abordou o problema num texto publicado em duas partes – uma no ano anterior e outra no ano seguinte ao Congresso – e que se intitulou “Literatura e cultura de 1900 a 1945”[3].
Nesse texto bem conhecido, Candido afirmava que, a partir de 1930, tinha sido sensível o aumento do público de literatura, devido à melhora da educação e à diminuição do analfabetismo. Entretanto, dizia, “esse novo público, à medida que crescia, ia sendo rapidamente conquistado pelo grande desenvolvimento dos novos meios de comunicação”, entre os quais nomeava o rádio, o cinema e as histórias em quadrinhos.
E continuava:

            Antes que a consolidação da instrução permitisse consolidar a difusão da literatura literária (por assim dizer), estes veículos possibilitaram, graças à palavra oral, à imagem, ao som (que superam aquilo que no texto escrito são limitações para quem não se enquadrou numa certa tradição), que um número sempre maior de pessoas participassem de maneira mais fácil dessa quota de sonho e de emoção que garantia o prestígio tradicional do livro.[4]

Por fim, apontava o crítico as respostas extremas à situação: a tentação da busca de comunicação com o público por meio da aproximação da literatura com o relato direto da vida, para concorrer com o rádio ou o jornal, ou o aprofundamento da singularidade do literário, restringindo ainda mais o acesso a ela por parte do público geral.
O problema da expansão e conquista do público estava na ordem do dia. Desde 1952, tinha merecido a atenção do poeta mais significativo dentre os que estrearam na década de 1940, João Cabral de Melo Neto.  Naquele ano, numa conferência intitulada “Poesia e composição”, proferida na Biblioteca Municipal de São Paulo – local emblemático do Modernismo –, Cabral tinha também se ocupado do problema da comunicação na literatura do pós-guerra, centrando-se na questão da poesia.
Nessa conferência, Cabral começa por opor os modos de composição que denomina “inspirado” e “construtivo”, dos quais derivariam duas famílias de poetas. Para os da família da inspiração, a poesia seria um achado, algo que acontecia ao poeta; já para os da família da construção, a poesia seria o resultado de uma busca, de uma elaboração.
O que dinamiza essa oposição, que em certo sentido retoma a tipologia de Schiller, é o quadro contrastivo que Cabral traça entre a condição moderna e a “época feliz” dos tempos não modernos. Naquelas “épocas de equilíbrio”, a espontaneidade é “identificação com a comunidade”, “o trabalho de arte inclui a inspiração”, as regras da composição são explícitas e universalmente aceitas, “a exigência da sociedade em relação aos autores é grande” e, por isso tudo, a comunicação é objetivo central da prática literária. Na modernidade, em contraposição, as condições são opostas: o que a define é a perda do leitor (e da crítica, epítome do leitor) como “contraparte indispensável do escritor”.  Sem esse fator de controle, as duas formas de composição se extremam em oposição radical, gerando famílias poéticas distintas e distantes, condenadas entretanto a se encontrarem, após o desenvolvimento de sua inclinação (isto é, depois de os inspirados esgotarem-se no “balbucio” incapaz de apreender o inefável e depois de arrastados os “construtores” ao artesanato furioso que conduz ao “suicídio da intimidade absoluta”), no isolamento solipsista, decorrente da “morte da comunicação”.
No quadro dessa modernidade descrita quase como beco sem saída, Cabral optava, contra o espontâneo, pelo polo construtivo. E o fazia, a rigor, como confirmação e último desenvolvimento da condição moderna, pois entendia que o poeta construtivo levava às derradeiras conseqüências o individualismo, na medida em que afirmava como referencial último da sua escrita “a consciência das dicções de outros poetas que ele quer evitar, a consciência aguda do que nele é eco e que é preciso eliminar a qualquer preço”.
 É esse o problema que Cabral retoma na tese que leu no Congresso de 1954, e na qual aborda especificamente a relação da poesia com os novos meios de comunicação de massa.
Nesse texto, embora ainda afirme o caráter multiforme da ‘poesia moderna’, Cabral acredita ser possível achar um denominador comum às práticas contemporâneas: o “espírito de pesquisa formal”. Em continuidade ao que apresentara na Biblioteca, dois anos antes, opera com a oposição entre as “duas famílias de poetas”. Mas já agora o que lhe importa é que nenhuma das famílias se teria empenhado em promover o “ajustamento do poema à sua possível função”, disso tendo resultado o caráter intransitivo e inócuo da poesia contemporânea em relação às necessidades do tempo. A tarefa urgente, afirma, é buscar para o poema uma função na vida do leitor moderno, seja pela adaptação aos novos meios de comunicação (o rádio, o cinema e a televisão), seja pelo retorno a formas que pudessem aumentar a comunicação com o leitor, como a poesia narrativa, as aucas catalãs (que ele considera as antepassadas das histórias em quadrinhos), a fábula, a poesia satírica e a letra de canção. Tendo em vista a urgência da tarefa, o seu texto termina por conclamar os poetas a combater “o abismo que separa hoje em dia o poeta do seu leitor”, por meio do abandono dos temas intimistas e individualistas e pela conquista de formas mais funcionais, que permitam “levar a poesia à porta do homem moderno”.

II. A Poesia Concreta


Quando as atas do Congresso Internacional foram finamente publicadas, em 1957, as preocupações de Cabral já tinham encontrado uma resposta programática de grande envergadura e radical aposta na integração da poesia no quotidiano da vida moderna.
Uma resposta cuja apresentação, ajuste e transformação constituiriam o centro de energia da poesia brasileira ao longo dos 50 anos seguintes: a Poesia Concreta.
Para compreender a especificidade do movimento, é preciso considerar com atenção dois textos que Augusto de Campos publicou em 1955.[5] Neles, Augusto afirma a existência de uma linha mestra evolutiva da poesia moderna à qual responde e se filia a Poesia Concreta:

            A verdade é que as “subdivisões prismáticas da Ideia” de Mallarmé, o método ideogrâmico de Pound, a simultaneidade joyciana e a mímica verbal de cummings convergem para um novo conceito de composição – uma ciência de arquétipos e estruturas; para um novo conceito de forma – uma ORGANOFORMA – onde noções tradicionais como início, meio, fim, silogismo, tendem a desaparecer diante da ideia poético-gestaltiana, poético-musical, poético-ideogrâmica de ESTRUTURA.[6]

             Nesse primeiro momento do projeto, portanto, a nova poesia não se apresentava como uma tentativa de superar o abismo entre o autor e o público. Na verdade, situava-se no pólo oposto, exigindo do leitor um esforço de obtenção de referências eruditas, de modo a poder aferir a arte de vanguarda como resultado de “uma ferrenha ânsia de superação culturmorfológica”[7]. Daí que a nova poesia demandasse, do autor tanto como do leitor, trabalho árduo e aplicação, sendo a ressurgência das formas tradicionais, que caracterizava a Geração de 45, duramente condenada por Haroldo.[8]
O passo seguinte da formulação do projeto constitui um dos pontos de maior interesse e tensão do programa da Poesia Concreta, tal como se delineará por ocasião do lançamento nacional do movimento: fazer coincidir a necessidade da evolução “culturmofológica” com as necessidades do mundo moderno, marcado pela técnica e dominado pelos meios de comunicação de massa. Isto é, fazer com que uma poesia elaborada a partir do pólo maior da negatividade, da recusa do leitor, como a poesia de Mallarmé, e articulada a partir do exemplo do artesanato joyciano, seja também um caminho para a positiva integração do poema no mundo industrial. Ou ainda: fazer com que a poesia que se reclama a origem mais erudita seja simultaneamente a poesia mais adequada à comunicação imediata com o leitor leigo e despreparado culturalmente.
Nesse quadro, a crise do verso e o abismo autor/público se explicam pela inadaptação do verso aos tempos modernos. À poesia não parece mais bastar a situação correta e conseqüente, face à evolução das formas. A evolução das formas deve ser agora valorizada e entendida em função da apropriação e aproveitamento dos recursos tecnológicos disponíveis, que são, ao mesmo tempo, o caminho para afirmar a poesia no mundo dos objetos industriais.[9]

É a retomada da questão enunciada por João Cabral de Melo Neto, no Congresso de 1954. Em relação às suas preocupações há aqui, entretanto, diferenças de fundo e de ênfase. A primeira delas é a recusa do verso – isto é, de todo o arsenal de formas tradicionais – como estratégia para recuperar a comunicabilidade da poesia nos tempos modernos. Essa estratégia se resume, agora, à integração da poesia aos meios de comunicação de massa e aos princípios que os estruturam. A oposição cabralina entre “expressão” e “construção” se acirra, com a desqualificação do primeiro pólo e absolutização do segundo como único adequado aos novos tempos. Economia, objetividade e rapidez são as palavras-chave desse momento da Poesia Concreta para conseguir a integração da poesia na vida quotidiana, como objeto industrial de consumo.[10]
Nos anos que se seguem imediatamente à Exposição Nacional de Arte Concreta, a ênfase no caráter racional, econômico e integrado do poema tenderá a ser substituída por uma modalização da forma de entender a poesia nova nos primeiros textos dos integrantes do grupo Noigandres. Passado o momento inicial, já não se ressaltará a utilidade, o poema como veículo de propaganda comercial ou objeto decorativo integrado à moderna arquitetura. Como dizia Haroldo já em maio de 1957, o poema concreto se vai valer de uma “linguagem afeita a comunicar o mais rápida, clara e eficazmente o mundo das coisas” para “criar uma forma”, criar “um mundo paralelo ao mundo das coisas – o poema”[11].
Na mesma linha, Augusto de Campos escrevia, assinalando uma mudança significativa de perspectiva, quanto à integração da poesia na vida quotidiana e conquista do público:

Mesmo quando circunstancialmente divorciada do grande público, como hoje, (e nesse caso a missão social da poesia estaria limitada a um plano mais alegórico do que factivo) é de crer-se que a poesia possa intervir, ainda que a posteriori, à medida que o tempo vá permitindo a absorção das novas formas, no sentido de pelo menos compensar o atrofiamento da linguagem relegada à função meramente comunicativa.[12]

           A questão da técnica, assim, é de importância central para o projeto concretista. Bem como a questão da comunicação. O que sofre alteração drástica, nos primeiros tempos de elaboração do projeto da Poesia Concreta, é a natureza e o lugar da técnica, por um lado; por outro, aquilo que se comunica com a técnica.
            Nesse segundo momento, o poema concreto, objeto autônomo, “paralelo ao mundo das coisas” comunicaria imediatamente a sua própria forma nova. E apenas ela.
             A introdução de uma formulação alegórica é o ponto de virada.
             A relação entre a poesia concreta e a tradição e entre a poesia concreta e o mundo contemporâneo – e essa é a resposta, portanto, à questão angustiosa de como fazer coincidir a vanguarda erudita com a arte adequada ao mundo dos mass media – passa a ser uma relação regida por um “como se”.
            O poema concreto é produzido como se fosse um produto industrial; ao mesmo tempo deve ser lido como aquilo que afirma ser: o herdeiro erudito da principal linha evolutiva da literatura ocidental.
Cabe ao leitor – a um leitor por suposto bem aparelhado culturalmente – juntar os elementos indicativos dessas vinculações para compor “a provável estrutura conteudística relacionada com o conteúdo-estrutura do poema concreto”.
Assim concebido, o poema concreto é proposto simultaneamente como a “fisiognomia de nossa época” e como esperança de futuro, na medida em que, incompreendido pelo grande público, seria comunicativo a posteriori, quando, absorvido, pudesse ser um antídoto ao atrofiamento da linguagem meramente comunicativa.



III. A poesia como cena tecnológica e utopia erudita


           Mas a base do argumento pela propriedade da linha evolutiva de que a Poesia Concreta representa o último passo permanece sendo a adequação ao tempo. Daí que se acentuem as homologias entre a técnica poética (a espacialização de Mallarmé e Cummings, os caligramas de Símias e Apollinaire, a palavra-valise de Carroll e Joyce, a paronomásia) e a técnica dos mass media e dos novos recursos tecnológicos (a visualidade do jornal e do cartaz, as possibilidades tipográficas da letra set e do computador, a visualidade da holografia e da tv). [13]
O que vem para primeiro plano, uma vez que é a “estrutura” o que se comunica, é a técnica. O poema não comunica algo valendo-se de uma determinada técnica. É a própria técnica – a técnica literária – o que o poema comunica, traz presente para o leitor.
O que define a técnica como literária e a opõe à técnica meramente industrial – que, neste segundo momento, a poesia concreta não mais se propõe a imitar ou incorporar, mas a antecipar – é a sua inserção num vetor de evolução, construído pelo discurso crítico e teórico. Um vetor propriamente literário, que corre paralelo ao vetor da determinação histórica das formas da comunicação industrial.
Por conta dessa necessidade de distinção, que implica a afirmação do caráter autônomo do desenvolvimento literário, nos manifestos e nos textos teóricos, a ‘explicação’ concreta do poema reduz-se à exposição da sua base técnica, à análise do funcionamento técnico do poema e à definição dessa base e dessa forma específica de atualização num quadro de evolução dos procedimentos na prática literária erudita.
Ou seja, na conjugação ou na afirmação da homologia das duas vertentes técnicas, o que ressalta é a vertente erudita, pois a Poesia Concreta não só se propõe “poesia” – e não objeto do mundo industrial –, mas ainda reclama para si o título de única poesia conseqüente na contemporaneidade. Ao mesmo tempo, essa afirmação de que é única poesia realmente contemporânea do presente implica afirmar uma equivalência dos vários presentes, ao longo do eixo temporal: em cada momento, seria possível distinguir qual seria a “poesia concreta” do seu tempo, isto é, a poesia que, em relação a ele, ocupava o mesmo lugar que a Poesia Concreta ocupa no presente. A afirmação dessa equivalência se faz não só pelo discurso teórico que define os “precursores”, mas, principalmente, por meio da tradução, que faz equivaler os vários momentos do passado ao presente da poesia concreta.
A polêmica da Poesia Concreta, assim, é sempre dupla e envolve uma questão de legitimidade ou de direito: a reivindicação do direito de um objeto que promove a superposição do erudito e do industrial reivindicar o nome e a tradição da poesia; e também envolve uma questão de exclusividade: a reivindicação de que só é poesia contemporânea e válida a que opera essa superposição
Daí resultam a proposição e a reivindicação simultâneas de que: a) a Poesia Concreta é a atualização radical e autoconsciente de uma experiência antiga: a experiência da invenção poética, ou seja, a experiência da poesia; e b) a afirmação da radical diferença entre o passado e o presente, porque a técnica que se dá como espetáculo já não é apenas a erudita, mas principalmente a tecnologia.
Dessa última proposição deriva a principal aporia da prática concretista.
Para expor essa aporia, deve-se considerar que a “técnica tecnológica”, pela sua natureza, muda mais rapidamente que a “técnica tradicional” da poesia. Ao mesmo tempo, o processo de avanço da técnica é freado pelo controle da autoria, da qual não abdica o poema concreto.
Ora, a “técnica tecnológica” é avessa ou alheia à noção de autoria. Por isso mesmo, o valor de espetáculo da “técnica tecnológica” tende a reduzir-se rapidamente a zero, com o passar do tempo. Da atualidade mais atual ao museu de velharias é um passo muito rápido no mundo da cibernética e dos mass media. Na verdade, esse passo é a mola secreta que movimenta não só a percepção e a satisfação da modernidade exasperada, mas também a indústria e o comércio dos aparelhos e dos conteúdos culturais.

Dessa necessidade de autoria, e da postulação de que pode e deve existir uma coincidência da técnica literária e da técnica tecnológica – e ainda mais: que a tradição, o repositório da evolução das formas da literatura ocidental, deva estar presente no momento da decodificação do poema concreto – resulta o caráter cediço e meramente histórico de experiências mais radicais, como poemas com hologramas, cartões perfurados de computador e sons sintetizados, cujo caráter “conservador”, do ponto de vista técnico, salta aos olhos de qualquer pessoa familiarizada com o mundo da técnica (e a familiaridade com esse universo propriamente técnico se torna universal a partir do momento em que se populariza o microcomputador, nos anos de 1980, e a internet, nos anos 1990).
Resulta ainda outro aspecto relevante e muito perturbador, que é o fato de que os poemas concretos mais diretamente vinculados à tecnologia informática guardam hoje interesse apenas como documentos históricos, pois o seu caráter antigo ou antiquado, do ponto de vista técnico, torna-os mais interessantes no quadro de um museu da ciência e da tecnologia, do que numa antologia poética.
Por outro lado, os que não são lidos apenas ou principalmente como testemunhos de um passado tecnológico morto são aqueles nos quais a tipografia ou a tipologia vem para primeiro plano (os da fase ortodoxa, os ideogramas de Décio, os “poemas embalagens” de Augusto), aqueles nos quais o caráter artesanal (e anti-industrial) é mais sensível (como o Poetamenos; os Poemóbiles; ou a Caixa preta) e aqueles nos quais a “técnica erudita” sobrepuja a “técnica tecnológica” (como A máquina do mundo e Crisantempo).
Sendo assim, o ponto de honra do programa concretista que era a absorção da técnica no quadro de referências da cultura erudita se revela cada vez mais uma missão impossível, um desafio perdido.
Daí decorre não só a eleição do lugar da recusa pelo poeta concreto (toda a obra madura de Augusto de Campos gira em torno da ideia de resistência, negação, subtração às demandas do presente[14]), mas ainda um tom algo nostálgico e melancólico que percorre toda a última fase da poesia concreta.
Nesse sentido, a experiência decisiva é a contemplação das animações por computador, das versões informáticas dos poemas concretos. O ritmo lento dá a esses exercícios uma solenidade estranha, porque jogada a sério, sem nada de jocoso ou de paródico.
Ao lado dos videoclipes de música, por exemplo, caracterizados pela sua enorme rapidez, e das anônimas animações das páginas da internet, o poema concreto padece simultaneamente da precariedade dos meios e recursos técnicos (o que é uma condição fatal, pois, sendo poema, pretende perdurar na sua forma “artística” de realização) e do deslocamento do sentido que essa precariedade opera sobre o seu próprio cerne, isto é, o seu caráter de vanguarda, de objeto situado no futuro, de modo a organizar a percepção do presente.
           Na época da disseminação da visualidade digital, a Poesia Concreta não consegue reproduzir a aliança entre técnica literária de vanguarda e técnica tecnológica de ponta. Em algum momento, essa aliança se configurou como possível. Hoje, ao que tudo indica, já não é. E a própria Poesia Concreta aparece, cada vez mais, não como a negação do humanismo – tal como ela se via e como a viam os contemporâneos –, mas justamente, pelo contrário, como um dos últimos suspiros do humanismo utópico, um momento de esplendor otimista da modernidade que findava.




Referências bibliográficas:

CAMPOS, Augusto et allii. Mallarmé. São Paulo: Perspectiva/Edusp, 1974.
CAMPOS, Augusto et allii. Teoria da poesia concreta. São Paulo: Duas Cidades, 1975.
CAMPOS, Augusto. Despoesia (1979-1993). São Paulo: Perspectiva, 1994.
CAMPOS, Augusto. Expoemas (1980­85), serigrafias de Omar Guedes. São Paulo: Entretempo, 1985.
CAMPOS, Augusto. Não, com CD-Rom CLIP-POEMAS. São Paulo: Perspectiva, 2003.
CAMPOS, Augusto. Poesia da recusa. São Paulo: Perspectiva, 2006.
CAMPOS, Augusto. Viva vaia (Poesia 1949­79). São Paulo: Duas Cidades, 1979.
CANDIDO, Antonio. Literatura e sociedade. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1975, 4.ª ed.
Congresso Internacional de Escritores e Encontros Intelectuais, São Paulo, Editora Anhembi Limitada, 1957.


Sítios eletrônicos:

Augusto de Campos – Site oficial: http://www2.uol.com.br/augustodecampos/
Haroldo de Campos – Site oficial: http://www2.uol.com.br/haroldodecampos/
Poesia Concreta – http://www.poesiaconcreta.com.br/



Notícia bibliográfica:

Esta é a reprodução do texto publicado na revista eletrônica Sibila, em 2009. Foi a primeira publicação em português. A versão inglesa veio em Portuguese Studies, Londres, March 22, 2008. Há uma versão on line em inglês em http://www.thefreelibrary.com/Poetry+and+technique:+concrete+poetry+in+Brazil.-a0177830242 . Como o texto não estivesse mais disponível no site da revista, decidi republicá-lo aqui.

Uma palestra sobre o mesmo tema: https://www.youtube.com/watch?v=pHtVgoLuYP8 



[1] Ver, a respeito, “Olavo Bilac e a unidade do Brasil republicano”. In Earle, T. F (org.) Actas do V Congresso da Associação Internacional de Lusitanistas. Oxford-Coimbra: Associação Internacional de Lusitanistas, 1998, vol. II, p. 697-706.

[2] Congresso Internacional de Escritores e Encontros Intelectuais, São Paulo, Editora Anhembi Limitada, 1957, pp. 150-1.
[3] Reproduzido em Literatura e sociedade.
[4] Literatura e sociedade, p. 137.
[5] Trata-se de “Poesia, estrutura” e “Poema, ideograma”, publicados em 20 e 27 de março, no jornal Diário de São Paulo. Ambos os textos se encontram reproduzidos em Augusto de Campos et alii, Mallarmé.
[6] “Poema, estrutura”. In Mallarmé, cit., p. 186.
[7] Haroldo de Campos, “Poesia e paraíso perdido”, Diário de São Paulo, 5 de junho de 1955; reproduzido em Augusto Campos et alii, Teoria da poesia concreta, pp. 26-30.
[8] Ibidem, pp. 27-8.
[9] o verso: crise. obriga o leitor de manchetes (simultaneidade) a uma atitude postiça. não consegue libertar-se dos liames lógicos da linguagem: ao tentar fazê-lo, discursa adjetivos. não dá mais conta do espaço como condição de nova realidade rítmica, utilizando-o apenas como veículo passivo, lombar, e não como elemento relacional de estrutura. anti-econômico, não se concentra, não se comunica rapidamente. destruiu-se na dialética da necessidade e uso históricos. [...]
uma arte geral da linguagem. propaganda, imprensa, rádio, televisão, cinema. uma arte popular.
a importância do olho na comunicação mais rápida: desde os anúncios luminosos até às histórias em quadrinhos. [...]
contra a poesia de expressão, subjetiva. por uma poesia de criação, objetiva. concreta, substantiva
Décio Pignatari, “nova poesia: concreta”. Publicado na revista ad – arquitetura e decoração (São Paulo, novembro/dezembro de 1956) e republicado, em maio do ano seguinte, no Suplemento Dominical do Jornal do Brasil, do Rio de Janeiro. Reproduzido em Augusto Campos et alii, Teoria da Poesia Concreta.
[10] a POESIA CONCRETA é a linguagem adequada à mente criativa contemporânea
permite a comunicação em seu grau + rápido / prefigura para o poema uma reintegração na vida quotidiana semelhante à q o BAUHAUS propiciou às artes visuais: quer como veículo de propaganda comercial (jornais, cartazes, TV, cinema, etc.), quer como objeto de pura fruição (funcionando na arquitetura, p. ex.), com campo de possibilidades análogo ao do objeto plástico / substitui o mágico, o místico e o “maudit” pelo ÚTIL.
Haroldo de Campos, “olho por olho a olho nu”, manifesto publicado conjuntamente com o de Décio Pignatari, há pouco referido. Encontra-se reproduzido no mesmo volume.
[11] Haroldo de Campos, “Poesia concreta – linguagem – comunicação”; reproduzido em Augusto Campos et alii,  Teoria da poesia concreta, pp. 70-85.
[12] Augusto de Campos, “A moeda concreta da fala”, texto publicado em 1/9/1957; reproduzido em Augusto Campos et alii,  Teoria da poesia concreta, pp. 111-122.
[13] Um conjunto significativo de poemas de Augusto de Campos, incluindo não só a reprodução de algumas de suas obras iniciais, mas também um ótimo exemplário das suas experiências com animação computacional, encontra-se no site oficial do autor: http://www2.uol.com.br/augustodecampos/ . Há poucos poemas de Haroldo de Campos e de Décio Pignatari on line e não é possível reproduzi-los aqui. Recomendo fortemente, por isso, que o leitor menos familiarizado com a Poesia Concreta brasileira visite o endereço acima, pois assim não só poderá uma visão de conjunto das várias fases do movimento, mas ainda adquirir elementos para melhor avaliar a reflexão apresentada neste artigo.
[14] Basta observar a seqüência dos títulos dos últimos livros: Viva vaia (1979); Expoemas (1985); Despoesia (1994); Não (2003); e a eles juntar o da sua última antologia de traduções: Poesia da recusa (2006).